Quatro
de setembro de 2008, quinta-feira. Igor Giovani Santos Rodrigues (12
anos) e João Victor dos Santos Rodrigues (13 anos) são reconduzidos
pela Conselheira Tutelar, Edna Aparecida Ribeiro Amante, à casa onde
moravam com seu pai e madrasta após terem sido encontrados pelo
guarda civil, José Messias Santos, perambulando pela rua na noite
anterior.
Os irmãos Igor Giovanni e João Victor
Segundo
relato das próprias crianças para o guarda-civil que os encontrou,
foram expulsas de casa, na quarta-feira (03/09/2008), pelo próprio
pai e que a madrasta, a dona-de-casa Eliane Aparecida dos Santos (36
anos na época), teria dado dinheiro para que eles fossem até a mãe,
mas que não tinham o endereço dela. Estavam, portanto, em busca da
mãe biológica.
Desde
2005 havia registros na polícia e no Conselho Tutelar que a
denunciavam, bem como ao pai das crianças, o vigia João Alexandre
Rodrigues (42 anos na época), por negligência e maus-tratos. Ambos
rejeitavam as crianças.
Os meninos se divertindo
No
ano de 2005, Eliane foi condenada por maus-tratos após uma tia
paterna das crianças ter denunciado o casal por abandono. Dois anos
depois foi registrado uma nova ocorrência sobre desaparecimento e
localização das crianças. Então, entre 2007 a maio de 2008 as
crianças permaneceram no Abrigo Novo Rumo, em Ribeirão Pires/SP.
Segundo a psicóloga do abrigo, Veronika Ferber Topio, João Victor
e Igor Giovanni “manipulavam a realidade” e, com base nesse
relatório, influenciou a decisão do juizado em encaminhar os
menores de volta para a casa de seus algozes.
A
mãe biológica das crianças, Claudia Lopes dos Santos, tinha 2
filhos de um casamento anterior e 2 filhos da relação atual, tendo
deixado os 2 meninos com o ex, pai das crianças, por falta de
condições financeiras. Segundo ela, a separação ocorreu porque
João Alexandre maltratava e batia muito em sua filha mais velha.
A madrasta Eliane
O pai João Alexandre
O
CRIME
Na
quinta-feira (04/09/2008), foram levados para casa pela conselheira
tutelar e o guarda-civil, cumprindo ordem do Juizado de Menores que,
embora soubessem das várias passagens dos garotos pelo Conselho
Tutelar por maus-tratos e abandono – pois, fugiam constantemente
por causa das agressões sofridas – ignoraram completamente esse
histórico existente contra o pai e a madrasta.
Segundo
Eliane, a madrasta, o pai teria se irritado com o retorno das
crianças. No dia 05 de setembro, sexta-feira, por volta das 16h, os
meninos assistiam TV na sala e o pai chamou João Victor para uma
conversa na cozinha. Ela disse que estava no quarto com Igor e ouviu
uns “barulhos estranhos” mas não ouviu gritos ou pedidos de
socorro. Depois, o pai chamou Igor e, passados alguns minutos, ela
foi à cozinha e viu os garotos caídos no chão com sacos plásticos
na cabeça. Então, o marido levou os dois para os fundos da casa,
colocou um corpo ao lado do outro, cobriu com um lençol, jogou
querosene e ateou fogo. Depois de um tempo, ela jogou água, mas ele
já estavam bem carbonizados e, então, procederam ao esquartejamento
com a foice.
Ao
terminar, o pai tomou banho e foi trabalhar, deixando a cargo da
madrasta a tarefa de colocar tudo em sacos de lixo e dar “um fim”.
Ela colocou 2 dos sacos em diferentes pontos do bairro e os 3
restantes na calçada em frente à própria casa. Às 22h ele ligou
para perguntar se tudo estava certo e, em seguida, ela ligou para a
irmã do marido dizendo que as crianças estavam desaparecidas.
Na
reconstituição do crime, o pai confessou que João Victor foi
asfixiado, mas Igor foi morto à facadas no quarto por Eliane...
depois, procedeu com a carbonização dos corpos e esquartejamento. A
polícia acreditava que ambos tinham sido mortos por asfixia porque
ambos apresentavam vestígios de sacos plásticos na cabeça, mas
João disse que isso foi porque, antes de carbonizá-los, colocou
sacos plásticos em suas cabeças e cobriu com lençol para, depois,
jogar querosene e queimá-los.
Sacos em que foram encontrados parte
dos corpos dos meninos
Os
corpos das crianças foram realmente colocados em 5 sacos de lixo
distribuídos em frente à casa da família e em outros pontos do
bairro, em Ribeirão Pires, SP, como relatado por Eliane. Lixeiros
encontraram os pedaços de corpos após a coleta, por volta da
0h15min e acionaram a polícia. Nas buscas realizadas na caçamba do
caminhão, encontraram outras partes parcialmente carbonizadas,
misturadas a outros objetos.
Por
volta das 2h do dia 6 de setembro, a polícia civil e a guarda civil
foram à casa das possíveis vítimas, perceberam uma das portas
abertas e perguntaram a uma mulher que lá estava – a madrasta –
sobre onde estavam as crianças; ela respondeu que, naquele dia, elas
não tinham voltado do colégio.
Nos
cômodos da casa, os policiais encontraram manchas de sangue e de
queimado, bem como restos mortais carbonizados no quintal da
residência, vísceras das crianças na fossa que fica atrás da
casa, além de um forte cheiro de água sanitária. João Alexandre
foi preso no dia 6 de setembro no seu local de trabalho e negou tudo,
colocando a culpa em Eliane.
Uma
vizinha afirmou ter visto uma fumaça saindo dos fundos da casa na
madrugada do crime, mas não desconfiou do que poderia ter
acontecido... não viram nem ouviram nada diferente neste dia. Outros
vizinhos afirmaram que os garotos eram calados e não costumavam
brincar na rua, que quando não estavam na escola, estavam trancados
em casa, sempre quietos e calados.
Uma
cabeleireira que atendia a madrasta das crianças disse que, certa
vez, Eliane comentou que estava com problemas no Conselho Tutelar por
causa dos meninos e que eles eram “levados”. Disse que a madrasta
chegou a comentar que os meninos tinham fugido de casa no dia 03 e
levados de volta pra casa no dia 04 pela guarda-civil, que os
encontraram na rua. Quando perguntou aos garotos porque eles tinham
fugido, eles ficaram calados, de cabeça baixa.
Entre
os objetos do crime foram encontrados uma foice, uma pá e as roupas
supostamente usadas pelas crianças na noite do crime – uma
bermuda, uma jaqueta jeans e duas blusas de moletom encontradas
dentro da máquina de lavar, que tinham um forte cheiro de querosene.
Também foi apreendido um volante de automóvel – a polícia
investiga se este foi usado para agredir os meninos antes de serem
mortos.
Instrumentos do crime
Uma
coisa é certa: a tragédia era anunciada... era apenas uma questão
de tempo...
DADOS
PROCESSUAIS
Em
17/04/2009 foi proferida sentença de pronúncia em face de Eliane e
João Alexandre:
Sentença
Proferida
Pronúncia
- Ante o exposto, com fundamento no artigo 413, do Código de
Processo Penal, PRONUNCIO ELIANE APARECIDA ANTUNES RODRIGUES, RG
50.707.895-SP, qualificada nos autos, como incursa no art.
121, §2º, incisos I, III, IV, V, observado o § 4º (parte final)
do mesmo artigo, por duas vezes, art. 211, por duas vezes, art. 248,
por duas vezes, e art. 347, parágrafo único,
todos do Código Penal e JOÃO ALEXANDRE RODRIGUES, RG 18.119.202-SP,
qualificado nos autos, como incurso no art.
121, §2º, incisos I, III, IV, V, observado o § 4º (parte final)
do mesmo artigo, por duas vezes, art. 211, por duas vezes, e art.
347, parágrafo único, todos do Código Penal.
Encontram-se os réus presos por força de prisão temporária e
posterior prisão preventiva. Assim, não teria sentido que, após a
pronúncia, viessem a ser soltos, sobretudo quando subsistem os
motivos da custódia cautelar, diante dos traços de periculosidade
evidenciados pelas circunstâncias indiciárias das práticas
delitivas, como acima apontadas, com imputação de duplo homicídio,
de natureza hedionda, com quatro qualificadoras, bem como pela
imputação de fraude processual, pela condenação anterior, embora,
ao que consta, sem o seu trânsito em julgado. Isso, somado aos
fundamentos da decisão que decretara a prisão preventiva às fls.
429/430 e o mais que dos autos conta, bem como pela repercussão
social, envolvendo aqui a própria credibilidade da Justiça,
evidencia-se a necessidade da custódia cautelar, preventiva, dos
acusados, para garantia da ordem pública, da conveniência
processual e garantia de aplicação da lei penal. Assim,
recomendem-se os acusados na prisão, expedindo-se os competentes
mandados para tanto. À luz do inciso LVII do artigo 5º da
Constituição Federal, que consagra o princípio da presunção de
inocência, o nome do acusado não poderá ser lançado no rol dos
culpados senão depois do trânsito em julgado da sentença
condenatória.
P.R.I.C.
Ribeirão Pires, 17 de abril de 2009.
Sidnei
Vieira da Silva Juiz de Direito
Denegaram
seu recurso em sentido estrito:
Por
V. Acórdão datado de 29/04/2010, da 8ª Câmara de Direito Criminal
do TJ, por votação unânime, negaram
provimento aos recursos em Sentido Estrito, restando mantida a r.
decisão monocrática que determinou o julgamento dos réus pelo
Tribunal do Júri por duplo
homicídio quadruplamente qualificado na forma consumada (art. 121,
§2º, incisos I, III, IV e V do CP, observado o §4º, parte final,
no mesmo artigo), em conexão com os delitos de destruição e
ocultação de cadáveres, por duas vezes, e fraude processual (art.
211 do CP e art. 347, § único, do mesmo diploma legal) e,
ainda, pelo delito de induzimento
à fuga de incapazes (art. 248 do CP), por duas vezes,
este último somente com relação à co-ré Eliane Aparecida Antunes
Rodrigues, tal como se deu na r. sentença de pronúncia., ficando
aberto o prazo para interposição de eventuais embargos ou recursos
No
tribunal, o promotor Abner Castorino apresentou uma carta escrita por
um dos garotos e emocionou o júri composto por 7 mulheres: “Queria
ter uma vida tranquila. Queria ter uma mãe. Queria ver meu avô.
Queria ser policial. Queria amar os outros e não ter inveja. Queria
ter Deus no coração. Queria ter uma bicicleta”. Disse ainda que,
apesar do que sofriam, as crianças eram carinhosas: “Um deles
tinha o apelido de 'Risonho'... buscavam a mãe biológica e tentavam
uma aproximação com o pai”. O promotor afirmou que as crianças
relataram à diretora do colégio onde estudavam que “não
confiavam em adultos”.
João
Alexandre Rodrigues foi condenado a 67 anos e 1 mês de prisão;
Eliane foi condenada a 59 anos e 6 meses.
Ouçam
parte do áudio da sentença, em reportagem feita pela Folha de
Ribeirão Pires:
Fonte:
G1 Globo – Folha de São Paulo
Site Terra
– Folha Ribeirão Pires – Estadão
Diário do
Grande ABC
Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo
Realmente uma tragédia anunciada, um dos piores crimes ocorridos no Brasil. Foi o crime que mais me comoveu, até hoje sinto uma dor no coração só de imaginar a trajetória de dor e abandono que esses meninos vivenciaram. Fiquei revoltada com a imprensa, principalmente com a Rede Globo, que só se preocupou em cobrir o caso "Isabela", sendo que o caso dos meninos esquartejados foi muito pior e ainda mais trágico ainda mais porque poderia ter sido evitado.
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