sexta-feira, 23 de agosto de 2013

CASO CHAN KIM CHANG - Rio de Janeiro/RJ (2003) - 17ª edição


O comerciante chinês Chan Kim Chang (46 anos) foi preso no dia 26 de agosto de 2003, no Aeroporto Internacional Tom Jobim, ao tentar embarcar para os EUA com US$ 31 mil não-declarados à Receita Federal. Conduzido ao Presídio Ary Franco, em Água Santa, foi encontrado no outro dia, em coma na cela, com um corte profundo do lado direito da cabeça e hematomas por todo corpo, quando seria libertado por determinação da justiça. Em coma profundo desde então, no Hospital Salgado Filho, no Meier, veio à óbito no dia 04 de setembro do mesmo ano.



Inicialmente, agentes disseram que o comerciante teria se auto-lesionado durante uma crise nervosa, o que foi afastado devido à gravidade das lesões... não havia dúvidas de que ele fora agredido na penitenciária. Em suas declarações os agentes alegaram que o chinês teria “surtado” e batido violentamente com a cabeça voluntariamente em um móvel da sala de identificação de presos. No entanto, a sala foi lavada após o “surto”, o que reforçou a suspeita de espancamento. As fotos do momento em que o chinês foi encontrado mostram que ele estava em posição fetal, o que, segundo os peritos, é característica de quem tenta se defender de uma agressão.

Segundo o laudo necroscópico do comerciante indicou que a causa da morte foi traumatismo craniano e uma pneumonia bilateral, além de múltiplos hematomas pelo corpo. O delegado não acreditou na versão dos agentes, pois:
se o chinês teve um surto, por que os agentes não estavam machucados?
por que não foi prestado nenhum socorro ao comerciante?
por que o comerciante estava com o corpo molhado na cela?

Com a morte do comerciante, o inquérito foi transferido para a delegacia de homicídios e o diretor do presídio, major PM Luiz Gustavo Matias, foi afastado por 30 dias.


DADOS PROCESSUAIS

No dia 03 de outubro foi decretada a prisão preventiva dos seguintes acusado pelo crime de tortura e morte do comerciante:
Everson Azevedo da Motta
Carlos Alberto de Souza Rodrigues
Raul Broglio Júnior
Ricardo Wagner Sarmento Alves
Ricardo Duarte Pires Valério
Carlos Luiz Correia
Denis Gonçalves Monsores
Eduardo Nunes de Moraes, o “Duda”
Paulo Sérgio de Araújo, o “Tric-Tric”
Cláudio Pereira da Costa, o “Gordinho”
Élio Henriques Bandeira (já estava preso no Ary Franco)

Élio era faxineiro no presídio e foi acusado de ter alterado a sala onde o chinês teria sido espancado, visando induzir em erro o perito e o juiz do processo penal. O major PM Luiz Gustavo Matias da Silva, que era diretor do presídio, foi denunciado pelo Ministério Público, mas não teve a prisão preventiva solicitada, pois, acusado do crime de omissão.

O juiz considerou necessária a prisão por garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal, pois, o crime causou clamor público e repúdio na sociedade, além de intranquilidade, especialmente por ter sido perpetrado por quem tinha o dever de zelar pela segurança e incolumidade física de pessoas que estejam sob a guarda e proteção destes (os agentes), não importa por qual razão.

Na sexta-feira, 26 de setembro de 2003, o preso Fabiano de Oliveira Costa participou de uma reconstituição do crime cometido contra Chan. No domingo à noite, 28, Fabiano foi encontrado em sua cela com uma queimadura na boca e manchas vermelhas e escoriações no pescoço. A direção do presídio recebeu a denúncia de possível agressão ocorrida contra Fabiano, retirou-o de sua cela, submetendo-o à exame de corpo de delito onde chegou na madrugada do dia 29.

Ao prestar depoimento, Fabiano negou ter sido espancado ou torturado e contou que se queimou sozinho porque dormiu com um cigarro aceso na boca. Claro... alguém esperava que ele dissesse algo diferente? Apesar disso, ao depor na Justiça Federal de Brasília, Fabiano confirmou o crime, ganhou proteção e concedeu uma entrevista à revista IstoÉ, na polícia federal de Brasília.
Link para a entrevista:

O relato de Fabiano faz parte da denúncia do Ministério Público, em conjunto com o testemunho de outro preso, Alexander Pinto Luzente. A narrativa repulsiva, encontrada no relatório de vários acórdãos interpostos pelos acusados, pode ser visto neste habeas corpus impetrado junto ao STJ – link: http://sdrv.ms/14fMvMW.
(Outros: HC 33737/RJ STJ – HC 31938/RJ STJ)

Em setembro de 2003 foi encaminhado um ofício à ONU relatando o caso: http://sdrv.ms/10IbPyp.

Em agosto de 2004, a Quinta Vara Federal Cível do Rio de Janeiro decidiu pela devolução de US$ 30,5 mil à família do comerciante chinês. Segundo o juízo, não é justo que o dinheiro fique com o Estado e que a devolução “ajuda a compensar a dor dos parentes pela perda”.

Em 2006, a União Federal foi condenada em segunda instância a pagar pensão mensal de 3 (três) salários mínimos à viúva do comerciante, Won Bi Chan, para sustentar e manter seus filhos, menores na época do acontecido. No julgamento de agravo, a Quinta Turma Especializada do TRF da 2ª Região confirmou a decisão da Justiça Federal.

A desembargadora Vera Lúcia Lima concluiu que, embora o crime tenha sido praticado por servidores estaduais, a União tinha o dever de zelar pela integridade física de Chang, porque a custódia era da POLÍCIA FEDERAL – por esse mesmo motivo, no Conflito de Competência n. 40.666, o STJ decidiu pela competência federal (link: http://sdrv.ms/17v24qj). A magistrada lembrou que a União utiliza presídios estaduais pelo fato de não possuir casas de custódia próprias e que a alegação de dependência econômica foi “cuidadosamente analisada” pelo juízo de 1ª grau – a União alegava que os cofres públicos sofreriam um prejuízo irreparável e que não havia elementos suficientes que comprovassem a “suposta” dependência econômica da autora.


No dia 30 de novembro de 2004 foi proferida a seguinte decisão pelo juízo da Quarta Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro:
→ sentença: http://sdrv.ms/14fKRe6
→ embargos que modificaram a sentença de seis dos condenados: http://sdrv.ms/14fKTTd

Fonte: sites de notícias
           Tribunal Regional Federal da 2ª Região


terça-feira, 20 de agosto de 2013

CASO JUAN - Nova Iguaçu/RJ (2011) - 16ª edição


O caso merece ser lembrado... dia 20 de junho de 2013 fez 2 anos da morte de Juan, um fato que repercutiu negativamente tanto pelos atores que dele fizeram parte, como pela forma como conduziram as investigações, além de envolver uma série de questões bastante conhecidas por nós quando o contexto é uma comunidade – o que engloba o estereótipo do traficante, a discriminação racial e, principalmente, social, os pré-julgamentos por parte daqueles que vivem sob pressão e não encontram qualquer amparo psicológico das instituições que representam, onde só existe a cobrança...
Link para fotos do caso: http://sdrv.ms/14Jxe9r



Favela Danon – Nova Iguaçu. Juan Moraes (11 anos) e seu irmão, Weslley Moraes (14 anos) voltavam para casa quando se depararam com um tiroteio entre policiais do 20º BPM e traficantes, num beco usado como atalho pelos moradores da região, por volta das 20h30min. Pelo menos, era o que se noticiava inicialmente – versão que, com a perícia, caiu por terra.

Sem ter como se defender, Weslley foi atingido no ombro e na perna e, socorrido por vizinhos, foi encaminhado para a UPA de Cabuçu, em Nova Iguaçu. Depois, sob escolta policial, foi transferido para o Hospital Adão Pereira Nunes, em Saracuruna. Juan, no entanto, desapareceu antes de Weslley ser socorrido.

Em depoimento, vizinhos confirmaram a versão de Weslley, que contou ainda ter visto Juan caído no chão baleado antes de desmaiar... só acordou a caminho do hospital não vendo mais seu irmão.

Quatro PPMM do 20º batalhão envolvidos na ação registraram o caso como auto de resistência na Delegacia de Comendador Soares (56ª DP) e nada disseram sobre o desaparecimento do menino. O comandante do batalhão só teve notícia desse fato ao conversar com os familiares do garoto.


DESENROLAR DOS FATOS

Somente após perícia feita no local do crime, 8 dias após o fato, quando encontraram o chinelo que Juan usava no dia 20, é que resolveram iniciar as buscas pelo corpo do garoto.

No momento do fato, passava pelo mesmo local o jovem Wanderson dos Santos de Assis, de 19 anos, atingido por 3 tiros nas costas. Wanderson estava sendo acusado de envolvimento com o tráfico e chegou a ser hospitalizado ALGEMADO no hospital, porém, a mochila que carregava no momento do fato só continha uma marmita e um frasco de desodorante. A Defensoria Pública entrou no caso, pediu concessão de liberdade provisória para Wanderson para que ele se recuperasse sem algemas e, posteriormente, alterar a condição de réu do rapaz, já que ele era vítima.

Em seu depoimento em juízo, Wanderson contou que, no dia do fato, não fora ao colégio por ter esquecido sua apostila em casa e passava pelo beco para encontrar uma garota. Foi a hora em que também passavam Juan e seu irmão Weslley e começou um tiroteio apenas na direção deles. Ele viu Juan cair na sua frente e se desesperou. Ao correr, levou os 3 tiros nas costas. Não viu ninguém no beco atirar contra os policiais.

Em declaração, o patrão de Wanderson, Jammil Seoud lamentou que, no dia do crime, o rapaz estivesse trabalhando até tarde para substituir um colega. Seu único motivo de ir à Danon naquela noite, era o encontro com uma garota. A família de Wanderson também ingressou no programa de proteção à testemunha.

Coincidentemente, na reconstituição do crime feita no dia 8 de julho de 2011 pela polícia, os peritos não constataram qualquer confronto no local, como afirmaram as testemunhas, e contrariando o depoimento dos réus.

Segundo depoimento de uma dona de casa que testemunhou o fato, PPMM atiraram em Juan após matar um traficante (Igor de Souza Afonso, de 17 anos) durante o confronto. Esconderam o corpo do menino atrás de um sofá deixado por um morador na rua e, meia hora depois, os policiais retornaram ao local, pegaram o corpo de Juan e jogaram na viatura. A dona de casa afirma que os policiais voltaram no dia seguinte e incendiaram o sofá.

Os quatro policiais tiveram suas prisões temporárias decretadas no dia 21 de julho de 2011, por dois homicídios qualificados (Juan e o suposto traficante), duas tentativas de homicídio qualificado (Weslley e Wanderson) e ocultação de cadáver de Juan:
→ Cabo PM Edilberto Barros do Nascimento
→ Cabo PM Rubens da Silva
→ Sgt PM Isaías Souza do Carmo
→ Sgt Pm Ubirani Soares

No dia 16 de setembro de 2011 os policiais tiveram a prisão preventiva decretada. Dois fuzis 762 deram positivo no exame de confronto balístico com os projéteis e cápsulas recolhidos no local do crime .

O corpo de Juan foi encontrado no dia 30 de julho às margens do rio Botas, em Belford Roxo. Na ocasião, a perita Marilena Campos de Lima, do Posto Regional de Polícia Técnico Científica de Nova Iguaçu, disse que o corpo era de uma menina, o que foi confirmado também pelo diretor do Departamento Geral de Polícia Técnico-Científica, Sérgio Henriques, após análises do esqueleto. Enquanto uns peritos diziam que o corpo teria ferimentos na cabeça, mas não provocados por arma de fogo, outro perito, Joelmir Portes, da Polícia Técnico-Científica disse que o cadáver tem um único ferimento no crânio: o maxilar quebrado – o que correspondeu, mais tarde, à forma como Juan foi morto: um tiro no pescoço. O avançado estado de decomposição pode ser compatível com o tempo de desaparecimento de Juan e, quanto à cor da pele, esta pode ter sido alterada pelas água, pois o corpo foi jogado no Rio Botas.

Após nova exumação para teste de DNA no dia 17 de agosto, cujos resultados comprovaram que o corpo era de Juan, a perita Marilena Campos de Lima foi exonerada e responde à sindicância.

A família de Juan encontra-se sob proteção do Estado que, segundo a Secretaria Estadual de Direitos Humanos, tem prazo de um ano, sendo prorrogado por mais um ano, porém, caso ao final do período a família ainda esteja em risco, o Estado garante a manutenção da proteção.

No dia 27 de setembro de 2012, os quatro policiais militares foram pronunciados como incursos nas sanções do artigo 121, §2º, incisos I e IV (homicídio de Igor), artigo 121, §2º, incisos I e IV na forma do § 4º, in fine (homicídio de Juan); artigo 121, §2º, incisos I e IV c/c art. 14, II (duas vezes) (tentativas contra Wanderson e Weslley), todos combinados com o artigo 61, inciso II, “g”, na forma do artigo 69, todos do Código Penal (processo n. 0045608-19.2011.8.19.0038).

O recurso ordinário em habeas corpus interposto em favor de Isaías, Rubens e Ubirani foi indeferido por conveniência da instrução criminal, sendo comprovada e fundamentada a “ameaça às testemunhas”. Link para o RHC:

O julgamento dos policiais pelo Tribunal do Júri aconteceu nos dias 09 à 12 de setembro de 2013, no Fórum de Nova Iguaçu:


Notícia publicada pela Assessoria de Imprensa em 13/09/2013 09:26
O Conselho de Sentença do Tribunal do Júri da comarca de Nova Iguaçu, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, CONDENOU os policiais militares Edilberto Barros do Nascimento, Isaias Souza do Carmo, Rubens da Silva e Ubirani Soares pelo assassinato  do menino Juan Moraes Neves.
A sentença foi proferida na madrugada desta sexta-feira, dia 13, no plenário do Tribunal do Júri. Os reús foram sentenciados a 66 anos (Edilberto), 36 anos (Rubens e Isaías) e 32 anos (Ubirani) de reclusão. Os crimes foram cometidos em junho de 2011, durante uma operação do 20° Batalhão da Polícia Militar (Mesquita), na Favela Danon, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
Na sentença, o juízo da 4ª Vara Criminal de Nova Iguaçu ressaltou o fato de os réus serem policiais militares. “Entendo que sua censurabilidade se afigura elevadíssima, pois a maior reprovabilidade do acusado possui guarida no fato de ser policial militar com o compromisso assumido perante a sociedade de zelar pela ordem e pela paz”.
Em outro trecho da sentença, o juízo destacou o papel de reação do Estado quando crimes contra a vida são cometidos. “Quando o Estado decide penalizar um transgressor, não o faz só para reprovar condutas violadoras do ordenamento jurídico. Pretende também com tal resposta impedir, coibir que os demais integrantes da sociedade se comportem de forma ilícita e reprovável”.
A maioria dos jurados entendeu que o PM Edilberto cometeu o crime de homicídio qualificado (sem chances de defesa da vítima), agravado pelo abuso de poder, contra as vítimas Igor Souza Afonso e Juan Moraes. O policial também foi sentenciado por duas tentativas de homicídio qualificado (abuso de poder e sem chances de defesa) contra Wesley Felipe Moares da Silva e Wanderson dos Santos de Assis.
Os demais réus foram absolvidos do crime cometido contra Igor, mas condenados pelos crimes de homicídio simples, agravado pelo abuso de poder, contra Juan. Os três também foram sentenciados por tentativa de homicídio contra Wesley e Wanderson.
O quarto e último dia de julgamento durou aproximadamente 17 horas. O Conselho de Sentença – formado por quatro juradas e três jurados – teve de responder a 36 perguntas formuladas pelo juízo. Tanto o Ministério Público quanto a defesa afirmaram em plenário que irão recorrer da sentença.
Processo n° 0045608-19.2011.8.19.0038

Fonte: UOL, Extra OnLine, Globo.com, Gabriela Sou da Paz
           Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

CHACINA DO BOREL - Tijuca/RJ (2003) - 15ª edição


Narrativa dos fatos: Movimento Rede Contra a Violência

“No final da tarde do dia 16 de abril de 2003, dezesseis policiais do 6º Batalhão de Polícia Militar realizaram uma operação no morro do Borel, zona norte da cidade do Rio de Janeiro. Impedidos de se identificarem, quatro rapazes foram assassinados durante a operação:
→ Carlos Alberto da Silva Ferreira, pintor e pedreiro, 21 anos;
→ Carlos Magno de Oliveira Nascimento, estudante, 18 anos;
→ Everson Gonçalves Silote, taxista, 26 anos;
→ Thiago da Costa Correia da Silva, mecânico, 19 anos.


Carlos Magno vivia com sua mãe e seu padrasto, na Suíça, onde estudava, e veio ao Brasil para se alistar no serviço militar, morando provisoriamente na casa de sua avó materna, no morro do Borel. Naquela tarde, foi encontrar com Thiago, amigo de infância, na barbearia – local mais procurado pelos jovens da comunidade – para cortar o cabelo, situada na Estrada da Independência, umas das principais vias de acesso ao morro e transitada por carros.

Ao saírem da barbearia, Magno e Thiago ouviram tiros e correram; Carlos Alberto, que acabara de chegar à barbearia, também ouviu os tiros e correu. Pensando que os tiros vinham de baixo, da própria Estrada da Independência, os três atravessaram a via e entraram numa vila em frente, conhecida como Vila da Preguiça, onde foram alvejados por policiais militares que estavam na laje de uma casa em construção na mesma vila.

Magno morreu na hora com 6 (seis) tiros – três pelas costas (cabeça, braço direito e região escapular esquerda) e três pela frente (ombro esquerdo, bacia e clavícula). Os tiros não partiam apenas da laje: Thiago agonizou no chão pedindo socorro e dizendo que era trabalhador: morreu após levar 5 (cinco) tiros – quatro pela frente e um pelas costas (região dorsal direita). O laudo atestou uma “alta energia cinética” na saída dos projéteis, o que demonstra que alguns dos disparos foram efetuados à queima-roupa.

Confirmando a versão dos disparos a curta distância, o laudo de Carlos Alberto também aponta para uma “alta energia cinética” na saída dos projéteis. “Carlinhos” sofreu 12 (doze) disparos, sete deles pelas costas, além de fratura no antebraço e no fêmur – importante observar que 5 dos disparos atingiram a parte interna do seu antebraço direito e mãos direita e esquerda – o que demonstra que tentava se defender dos tiros efetuados contra ele.

Everson Silote voltava para casa à pé quando foi rendido por policiais militares na Estrada da Independência e, trazendo na mão um envelope com todos os seus documentos, tentou se identificar e, por esse motivo, teve seu braço direito quebrado por um golpe do policial – foi executado antes de mostrar os documentos que trazia. Levou quatro tiros pela frente (dois atingiram cabeça e coração) e um pelas costas (próximo à coluna cervical).

Foram baleados, ainda, Pedro da Silva Rodrigues e Leandro Mendes. Os corpos de Magno, Thiago, Carlos e Everson foram colocados na viatura estacionada na saída da Estrada da Independência, sem que nenhum familiar conseguisse se aproximar, tendo que se conformar com as instruções dos policiais: “Se quiser ver vai atrás, no (Hospital do) Andaraí”.

Perícias foram realizadas pela Polícia Federal, em maio e pelo Instituto Carlos Éboli, em junho do ano de 2003, acompanhadas pelo Corregedor-Geral da Polícia, concluindo que os quatro rapazes foram mortos em uma emboscada, levando o delegado Orlando Zaccone a indiciar apenas 5 (cinco) dos dezesseis policiais envolvidos por homicídio qualificado.


PROCESSOS

Em 27 de outubro de 2004 e em 14 de fevereiro de 2005 foram absolvidos, respectivamente, o 3º sargento da PM, Sidnei Pereira Barreto, e o 2º tenente da PM, Rodrigo Lavandeira Pereira – este último, quem comandou a operação no Borel – ambos defendidos pelo Dr. Clóvis Sahione.

Em 18 de outubro de 2006 foi julgado e condenado o cabo Marcos Duarte Ramalho à 52 anos de reclusão (link para a sentença: http://sdrv.ms/19nzjeR), em regime inicialmente fechado e à perda da função pública, decisão que foi mantida no julgamento do protesto por novo júri, recurso a que teve direito por sua pena ter ultrapassado 20 anos. Segundo informações, esta sentença foi alterada para 49 anos de prisão. Porém, em 12 de março de 2009, a Quinta Câmara Criminal do TJRJ decidiu, por maioria, aceitar o recurso apresentado pela defesa de Marcos Ramalho, que cumpria pena, anulando o julgamento de 27 de novembro de 2006, sendo, então, libertado e aguarda novo julgamento.

Apresentando recursos em todas as instâncias possíveis, conseguiram adiar seu julgamento o quanto puderam os réus Washington Luís de Oliveira Avelino (pendente de recurso no STJ) e Paulo Marco da Silva Emílio – ambos também defendidos por Clóvis Sahione e Amaury Jorio. Este último, foi julgado e absolvido em 29/11/2010, mas no aguardo de julgamento de recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público (nesse momento, aguardava as contrarrazões da Defensoria Pública) – informações dos autos do processo n. 0148817-96.2003.8.19.0001, na data de 18 de abril de 2011.

O recurso de Apelação em face da absolvição de Paulo M. S. Emílio ainda aguarda julgamento:

Apenas o réu Marcos Duarte Ramalho seria levado a novo julgamento em fevereiro de 2011, mas este foi adiado a pedido da defesa devido a uma “infiltração” na sala do plenário do II Tribunal do Júri, sendo transferido para do dia 09/05/2011 e, novamente, retirado da pauta (não conseguimos saber o motivo). Informações na mídia contam que este foi absolvido, mas não encontramos esta informação no site do Tribunal.

O Movimento Rede Contra a Violência chama a atenção para os seguintes detalhes:
→ se o próprio comandante da operação é desresponsabilizado, quem será o responsável?
→ um fuzil desapareceu misteriosamente;
→ cerca de 15 projéteis transfixaram os corpos das vítimas; apenas 4 foram periciados, constatando a perícia que foram disparados por armas de policiais que integravam o grupo do 3º sargento (que foi absolvido).

Fonte: Movimento Rede Contra a Violência
           Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro


domingo, 11 de agosto de 2013

CASO DAMIÃO XIMENES LOPES - Sobral/CE (1999) - 14ª edição


Esta não é uma história como as que costumamos ver nesta série... não houve uma chacina, o crime não foi passional nem motivado por vingança... aliás, sequer houve motivo que o justificasse – não que outras atrocidades se fundamentem por qualquer motivo mas, no fundo, sabemos que para o autor SEMPRE tem um motivo, por mais esdrúxulo que este se apresente.

                                              
Passo, agora, a relatar a história de Damião Ximenes Lopes, inicialmente, segundo o depoimento de um familiar.

Meigo, compreensivo, introvertido e de olhar pensativo, Damião Ximenes Lopes, então com 30 anos de idade, levou uma vida normal até seus 17 anos. Após sofrer uma pancada na cabeça, em 1982, Damião repentinamente falava coisas sem nexo e, com o passar do tempo, tornou-se depressivo, quadro que perdurou por 13 anos, alternando momentos de crise e de normalidade, cada vez mais prolongadas e frequentes.

Em dezembro de 1995 sua situação agravou-se e Damião foi internado na Casa de Repouso Guararapes, em Sobral, no Ceará. Recebeu alta 2 (dois) meses depois dependente de remédios controlados. Damião não comentava suas experiências na referida instituição mas, para quem perguntava sobre, ele respondia que “era só violência”.

Damião não suportava mais os medicamentos e, em março de 1998, teve uma recaída. Seus familiares o levaram à Fortaleza onde se consultou, recebeu medicamento e voltou para casa, passando muito mal durante a viagem. Agitado, descontrolou-se, de modo que o motorista bateu o carro e Damião sai caminhando sem rumo. A polícia conseguiu localizá-lo, trouxe Damião amarrado num carrinho de mão e conduziu-o diretamente para a Casa de Repouso de Guararapes. Descrição do que a família presenciou durante a visita:

(...) nunca vi tanta sujeira, moscas e pessoas entregues ao lixo. Uns andavam completamente nus; no pátio encontrei Damião, com roupas limpas, mas quando lhe abracei senti mau cheiro, parecia não fazer higiene corporal diária. Minha mãe dava agrados a cozinheira para cuidar de Damião. E levava tudo para ele, até o papel higiênico, pois o hospital não tinha nada. Não deixei de observar os ferimentos no corpo dele, principalmente nos joelhos e tornozelos. Pedi explicação ao funcionário que estava próximo, ele alegou que havia se ferido numa tentativa de fuga”.

Não tinha nenhum médico presente no momento que pudesse dar maiores explicações à família e, após uma semana, Damião recebeu alta. Seus relatos? Dizia que o pessoal do hospital era ruim, que os enfermeiros eram os piores, que batiam nos internos... seus familiares achavam que ele estava com o pensamento confuso (!).

O comportamento de Damião estava cada vez mais apático... com o passar do tempo, deixou de tomar seus remédios, não dormia mais e rejeitava alimentação, o que fez com que seus parentes o levassem para uma consulta no dia 01 de outubro de 1999, no Hospital Guararapes, onde chegou às 6hs e, como não havia médicos no momento, resolveu interná-lo para que recebesse cuidados médicos.

No dia 04 de outubro de 1999, ao visitá-lo, informaram à Dona Albertina na portaria que ele não podia receber visitas... apavorada, Albertina entrou à força na instituição gritando pelo nome de Damião, que veio ao encontro de seu parente cambaleando, com as mãos amarradas para trás, roupa toda rasgada com a cueca à mostra, sujo de sangue, exalando um odor horrível à urina, fezes e sangue podre. Nas fossas nasais havia bolhas de sangue coagulado, rosto e corpo com sinais de espancamento, caiu aos pés de sua mãe, pronunciando apenas as palavras “polícia, polícia, polícia”.

Uma faxineira contou que presenciou os auxiliares de enfermagem e monitores do pátio espancarem Damião. Sua mãe, Albertina, pediu que dessem um banho em Damião e, como ele não conseguia mais se mover, foi preciso 3 homens para levá-lo para o banho. Pediu, então, que o Dr. Francisco Ivo de Vasconcelos fosse ver seu filho, pois, achava que ele ia morrer... resposta de Dr. Ivo?

Deixa morrer, todo mundo que nasce morre”. E ainda mandou a Dona Albertina calar a boca, parar de chorar, porque ele nem assistia novela porque não gostava de choro. De onde estava, esse “profissional da saúde pública” receitou um medicamento injetável e entregou a um enfermeiro que estava ao seu lado para aplicar em Damião. Não foi ver se o paciente tinha condições de receber o referido medicamento, não se interessou pelo pedido de socorro da mãe, não se preocupou com a vida de Damião.

Ao retornar para ver Damião, encontrou o mesmo nu, deitado de bruços no chão ao lado da cama, ainda com as mãos amarradas para trás e foi recomendado que não tocasse em seu filho, pois, ele havia tomado um remédio para dormir. Foi embora para casa, à 72 km de Sobral (onde localizava-se a Casa dos Horrores, ops! digo, de “Repouso”) e, ao chegar, recebeu um telefonema de Guararapes solicitando sua presença com urgência: Damião estava morto!

Laudo médico de Dr. Ivo? “Causa mortis NATURAL... parada cardio-respiratória!
Ao dar a noticia-crime na delegacia e requisitar laudo pericial, não adiantou adivinhem? Dr. Ivo TAMBÉM era o médico legista da polícia. O corpo, portanto, foi enviado ao IML de Fortaleza. Lá, novamente indignados, a família deparou-se com esta conclusão: “causa mortis indeterminada e sem elementos para responder”!

A Casa de Repouso foi desativada pelo governo de Cid Gomes
(relato disposto no link: http://www.apavv.org.br/casos/D/005.htm)


O CASO

Em 22 de novembro de 1999, Irene Ximenes Lopes Miranda peticionou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado Brasileiro.
Caso n. 12.237 

Em 04 de julho de 2006, a Corte Interamericana de Direitos Humanos divulgou a decisão referente ao caso de Damião, determinando ao Estado brasileiro:

pagamento, no prazo de um ano, de indenização pecuniária à familiares da vítima por danos materiais e imateriais;
garantia, em prazo razoável, da conclusão do processo judicial interno, julgando os responsáveis pela morte de Damião;
continuidade do desenvolvimento de programas de formação e capacitação de profissionais envolvidos no atendimento à saúde mental.

No ano de 2008, foi considerado procedente o pedido de indenização por danos morais, pela 5ª Vara da Comarca de Sobral, que condenou a Casa de “Repouso” Guararapes, o médico Francisco Ivo de Vasconcelos e o diretor Sérgio Antunes Ferreira Gomes a pagar R$ 150 mil em indenização à mãe de Damião, sentença esta que foi confirmada em 2010 pela 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará.

Recorreram ao STJ com o intuito de revisar o valor da indenização, o que foi negado em 05/12/2012:

A condenação do Brasil na CIDH contribuiu para acelerar o processo de aprovação da Lei n. 10.216/2001, cuja base é a defesa dos direitos do paciente mental, a mudança do modelo de assistência em instituições como a Casa de “Repouso” Guararapes por uma rede de cuidados aberta e localizada na comunidade e o controle externo da internação psiquiátrica involuntária, nos termos da Declaração de Direitos do Paciente Mental da ONU, de 1991. Entre tantas medidas, surgiu o CAPS – Centro de Apoio Psicossocial em todo o país. Em Sobra, no Ceará, fundaram o CAPS Damião Ximenes Lopes, em sua homenagem (http://sobralagora.blogspot.com.br/2010/07/este-e-o-centro-de-atencao-psicossocial.html).





PROCESSO CRIMINAL

Em 27 de março de 2000 foram denunciados pelo crime de maus-tratos:
→ Sergio Antunes Ferreira Gomes
→ Carlos Alberto Rodrigues dos Santos
→ André Tavares do Nascimento
→ Maria Salete Moraes de Mesquita

Em 25 de maio de 2000, promotores do Centro de Apoio Operacional dos Grupos Socialmente Discriminados da PGJ declararam que a denúncia deveria ser aditada com os seguintes personagens:
→ Francisco Ivo de Vasconcelos
→ Marcelo Messias Barros
→ Maria Verônica Miranda Bezerra
→ José Eliezer Silva Procópio

Apesar disso, a promotora solicitou o aditamento apenas de Francisco Ivo e Elias Gomes Coimbra, em 22 de setembro de 2003.

No ano de 2009, o juízo da comarca de Sobral condenou a 6 (seis) anos de reclusão pelo crime de maus-tratos seguido de morte, a serem cumpridos inicialmente em regime semiaberto:
→ Sérgio Antunes Ferreira Gomes (dono da casa de “repouso”)
→ Carlos Alberto Rodrigues dos Santos / Elias Gomes Coimbra / André Tavares do Nascimento (auxiliares de enfermagem)
→ Maria Salete Moraes Melo de Mesquita (enfermeira-chefe)
→ Francisco Ivo de Vasconcelos (médico de plantão no dia do ocorrido).

Em 2006, antes mesmo da sentença penal e da sentença cível, o ConJur noticiou os avanços conseguidos com este caso na OEA. Vale a pena a leitura.

Resta torcermos para que nunca mais se repita...



quinta-feira, 8 de agosto de 2013

CHACINA DE NOVA BRASÍLIA - Complexo do Alemão/RJ (1994) - 13ª edição


Em 15 de outubro de 1994, supostos traficantes da Favela Nova Brasília dispararam vários tiros contra a 21ª Delegacia de Polícia de Bonsucesso, ferindo 3 (três) policiais.

No dia 18 de outubro de 1994, sob alegação de cumprir 104 (cento e quatro) mandados de prisão temporária, 110 (cento e dez) policiais civis da Divisão de Repressão a Entorpecentes da 21ª DelPol e de outras unidades da Polícia Civil, entraram na favela por volta das 5h da manhã.

Saldo: 13 (treze) mortos e 3 (três) casos de abuso sexual. A Comissão Especial, nomeada pelo próprio Governador do Estado para investigar o caso, concluiu que pelo menos algumas das pessoas que morreram nessa operação foram executadas pelos policiais. Uma das vítimas, Evandro de Oliveira, morreu baleado nos dois olhos. Outra vítima recebeu 7 (sete) tiros na nuca e outros 2 (dois) tiros na cabeça.

O Centro pela Justiça e o Direito Internacional – CEJIL, e a Human Rights Watch/Americas apresentaram denúncia contra o governo brasileiro na Comissão Interamericana da OEA, em 24 de julho de 1996.
(Petição de admissibilidade, datada de 21 de fevereiro de 2001:

Após a denúncia feita em 24 de julho de 1994, a Comissão solicitou informações ao Brasil acerca dos fatos narrados nesta denúncia em 19 de novembro de 1996. O Estado pediu à Comissão duas prorrogações do prazo para sua contestação e só o fez em 7 de agosto de 1998.


DADOS CONSTANTES NA PETIÇÃO DE ADMISSIBILIDADE

As vítimas do caso:
1 – Evandro de Oliveira
2 – André Luiz Neri da Silva
3 – Alberto dos Santos Ramos
4 – Macmillea Faria Neves
5 – Adriano Silva Donato
6 – Alex Viana dos Santos
7 – Alexandre Batista dos Santos
8 – Alan Kardec Silva de Oliveira
9 – Sergio Mendes de Oliveira
10 – Clemilson dos Santos Moura
11 – Robson Genuíno dos Santos
12 – Fabio Henrique Fernandes Vieira
13 – Ramilson José de Souza
Suposto abuso sexual contra J.F.C., C.S.S. e L.R.J.



Segundo informações, um grupo composto por 110 (cento e dez) policiais civis da Divisão de Repressão a Entorpecentes (DRE) do Rio de Janeiro, invadiram a favela Nova Brasília, em 18 de outubro de 1994, às 5h da manhã para cumprir 104 mandado de prisão temporária. Não negam que houve confronto armado entre traficantes e policiais, porém, foram cometidas uma série de violações de direitos humanos como relatamos a seguir:

um primeiro grupo de policiais invadiu a casa de J.F.C. e seu namorado conhecido como “Paizinho” que, depois de rendidos foram espancados – 'Paizinho' com golpes na cabeça e ameaças de morte, e J.F.C. com golpes nas pernas e barriga – para que dissessem onde se encontrava um dos líderes do tráfico local;

esses mesmos policiais invadiram contra outra casa de traficantes matando Adriano Silva Donato e Alan Kardec, cujos corpos foram arrastados para fora da casa e levados até a praça, onde também foi executado sumariamente Clemilson dos Santos, arrastado até a mesma praça;

um segundo grupo de policiais invadiram uma casa e executaram sumariamente Sergio Mendes, Fabio Henrique e Evandro de Oliveira, sendo que este último recebeu um tiro em cada olho. Em seguida, invadiram outra casa e também executaram Robson Genuíno, Ranílson José e Alberto dos Santos;

um grupo de dez policiais invadiram outra casa onde estavam C.S.S., L.R.J. e André Luiz Neri Silva: C.S.S. e L.R.J. sofreram abuso sexual, além de espancarem L.R.J. e André para obter informações sobre um dos líderes do tráfico local. Depois, prenderam André, que foi encontrado posteriormente morto, junto com os demais cadáveres na praça local.

Dois inquéritos foram instaurados: IPL n. 184/94 – para apurar as irregularidades da ação policial – e o IPL n. 52/94, que concluiu que os policiais praticaram execução sumária e outros abusos, mas nenhum dos agressores identificados pelas vítimas prestou depoimento ou foi preso.

De acordo com os peticionários, a promotora Maria Inês Pimentel, responsável pelo acompanhamento dos inquéritos, se recusou a prestar qualquer tipo de informação sobre os mesmos.

Em resposta, o Estado Brasileiro confirmou a ação policial, evidenciando que houve reação violenta dos traficantes e que 3 (três) policiais civis ficaram feridos na ação. Os inquéritos instaurados contêm como anexos autos de exame cadavérico, onde o Ministério Público verificou que alguns cadáveres apresentam perfurações nos dois olhos, demandando uma investigação mais apurada e finaliza com a desculpa de “falta de tempo hábil” – convém lembrar que esta petição de admissibilidade data de 2001, ou seja, 7 (sete) anos depois!!!!

Quanto às denúncias sobre abuso sexual, entendem que “deve haver uma investigação mais apurada pois, no local impera a 'lei do silêncio' e existe uma tendência à 'desmoralizar a polícia', onde os traficantes oferecem prêmios a quem o fizer”.

Segundo informações, aproximadamente 10 (dez) pessoas morreram com tiros na cabeça; apenas 3 (três) dos mortos tinham antecedentes criminais comprovados!!

Na época, o titular da DRE – Delegacia de Repressão aos Entorpecentes – Maurílio Moreira, afirmou que a operação foi uma resposta à ação na 21ª DP, metralhada três dias antes (15/10/1994), quando 3 (três) policiais ficaram feridos – o que coincide com as informações no início desta narrativa.


NOTÍCIA VEICULADA DIA 20 DE MAIO DE 2013 – QUASE 19 ANOS DEPOIS

O Ministério Público do RJ ofereceu denúncia contra 4 (quatro) policiais civis e 2 (dois) policiais militares envolvidos na chacina de 13 pessoas na favela Nova Brasília, em 18 de outubro de 1994. Cada um deles foi denunciado 13 (treze) vezes pelo crime de homicídio duplamente qualificado:
Rubens de Souza Bretas (inspetor da Delegacia Anti-Sequestro);
Plínio Alberto dos Santos Oliveira (policial militar inativo);
José Luiz Silva dos Santos (policial militar inativo);
Ricardo Gonçalves Martins (inspetor lotado no serviço de manutenção);
Carlos Coelho Macedo (inspetor inativo);
Paulo Roberto Wilson da Silva.

O Procurador Antonio Biscaia, assessor criminal do MPRJ, o promotor Alexandre Themístocles, coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crimes Organizado e o promotor Marcelo Muniz estão à frente destas providências e participaram de uma reunião da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, em Washington/EUA, que aconteceu no mês de março, para apresentar as medidas adotadas quanto às recomendações expedidas.

Segundo os promotores, as recomendações da Comissão, a descoberta de novas provas e o fato de o arquivamento ter sido realizado por uma vara criminal – sem competência para apreciar o caso – foram os motivos que levaram ao pedido de desarquivamento.

Primeiramente, desarquivaram em janeiro de 2012 o inquérito referente ao crime ocorrido em Nova Brasília, no ano de 1995 e, em março de 2013, o relativo ao crime ocorrido em 1994 – nosso caso em comento.

O inquérito referente ao caso em tela foi arquivado em 2005. Segundo o MP, as vítimas de abusos sexuais reconheceram na época os policiais envolvidos e que o procedimento foi mal conduzido. Já estavam praticamente confirmados 13 (treze) homicídios e, embora, a maioria dos assassinados fossem realmente criminosos, suas execuções ocorreram de forma que impossibilitou sua defesa. Desta forma, constatadas a execução, lesões corporais e abuso sexual, é evidente “franca subversão ao suposto objetivo originário”. Que operação para execução de mandado!!!

Vamos acompanhar os fatos...


Fonte: CBN Globo
           Comissão Interamericana de Direitos Humanos

sábado, 3 de agosto de 2013

CHACINA DE CORUMBIARA - Corumbiara/RO (1995) - 12ª edição


Dados constantes no Relatório n. 77/98, petição de admissibilidade à Comissão Interamericana de Direitos Humanos – OEA, Caso n. 11.556, Corumbiara, Brasil – 25 de setembro de 1998.


NARRATIVA DOS FATOS

A Fazenda Santa Elina, situada perto da cidade de Corumbiara, cuja titularidade se achava em litígio, foi objeto de disputa judicial em virtude da qual 540 famílias, de maneira organizada e pacífica, ocuparam a fazenda em 15 de junho de 1995. a titularidade do domínio era questionada pelo Instituto de Reforma e Colonização Agrária, que teria emitido parecer favorável à colonização do mesmo. A despeito disso, o juiz da causa ordenou a devolução da fazenda ao proprietário.

A negociação entre a Polícia do Estado de Rondônia e os camponeses sobre o desalojamento foi complexa. Depois de diálogo em que se intimou os camponeses a que desocupassem a fazenda, os policias se retiraram do local. Horas mais tarde, na madrugada de 9 de agosto de 1995, regressaram e procuraram forçar o desalojamento das famílias ocupantes. Houve então um enfrentamento armado e a alegada repressão policial. Essa operação teve um saldo de 11 (onze) trabalhadores rurais e 2 (dois) policiais mortos, 53 (cinquenta e três) feridos e 355 (trezentos e cinquenta e cinco) pessoas detidas. Também foram denunciados maus-tratos e torturas por parte da polícia após o incidente. Posteriormente, em 18 de dezembro de 1995, foi apresentado um aditamento à denúncia referente ao assassinato de um síndico de Corumbiara, que teria relação com os direitos anteriormente denunciados”.
* Relatório posterior diz que o saldo, na verdade, corresponde a 15 trabalhadores rurais, Vanessa dos Santos Silva, de 7 anos de idade (atingida pelas costas) e 2 policiais mortos.


Síntese da narrativa dos fatos constantes no Relatório n. 32/04, quanto ao mérito, de 11 de março de 2004.

Os peticionários informam que resistiram sim ao despejo, atirando pedras, paus, acendendo foguetes, porém, negam que tenham a tirado na polícia, como esta afirma em seu depoimento. Confirmam que, nessa primeira tentativa, a polícia começou a atirar no grupo de homens, mulheres e crianças, colocando a vida de todos em risco e apontam que esta ação deixou o saldo de uma vítima baleada, o trabalhador Adão Mateus da Silva. Isso aconteceu em 19 de julho de 1995.

O juiz Roberto Gil, portanto, teria autorizado Vitório Regis Mena Mendes, o Capitão Mena, a empregar mais policiais para cumprir a liminar de desocupação, porém, que isso deveria ser feito com moderação e cautela para que não resultasse em tragédia, como acontece na maioria dos casos.

Confirmam a participação dos proprietários da Fazenda Santa Elina, Helio Pereira de Morais, e da Fazenda São Judas Tadeu, Antenor Duarte, que pressionaram as autoridades do Poder Executivo e Judiciário do Estado de Rondônia para que as famílias fossem removidas do local.

Com o apoio dos agricultores da região, os policiais montaram campana em uma fazenda próxima à Fazenda Santa Elina e, em torno das 3 horas da manhã do dia 9 de agosto, deram início a operação policial de despejo na Santa Elina. Segundo as provas constantes nos autos, participaram proprietários de terra locais, pistoleiros da região e policiais, incluindo 3 (três) que se encontravam de férias.

Argumentam os peticionários que os policiais utilizaram mulheres como escudo humano e, dessa forma, conseguiram render dois dos trabalhadores que, armados, resistiam ao despejo e, posteriormente, os executaram. Algumas das vítimas:

José Marcondes da Silva (50 anos) foi executado quando rendido – a perícia apontou um tiro à queima-roupa no crânio e outros ferimentos à bala no abdômen, costas e peito. O exame balístico combinou com as balas disparadas pelo soldado da PM José Emílio da Silva Evangelista;

Ercílio Oliveira Campos (41 anos), teve o rosto desfigurado por 16 tiros na cabeça, ombro e braço, a maioria à queima-roupa, conforme exame pericial. Esses exames corroboram a versão de que José e Ercílio foram executados após sua rendição;

Enio Rocha Borges, outro trabalhador, morreu em circunstâncias diferentes e não esclarecidas; chegou vivo ao hospital, vindo a falecer posteriormente. A perícia não conseguiu esclarecer a natureza das lesões que causaram sua morte ou a trajetória dos projéteis;

Nelci Ferreira (24 anos) foi morto com 2 tiros na parte de trás da cabeça, à queima-roupa segundo a perícia, quando este ajudava um companheiro ferido. Não identificaram as armas de onde partiram os disparos;

Alcindo Correia da Silva (52 anos) recebeu um único tiro quando estava ajoelhado. O projétil percorreu da orelha até o quadril, à queima-roupa. Não conseguiram identificar a arma de onde partiu. Segundo depoimento de familiares, um policial usando um capuz preto disparou contra a cabeça da vítima quando esta estava ajoelhada;

Odilon Feliciano foi atingido por um tiro na parte de trás da cabeça, à queima-roupa. A perda do projétil não permitiu a identificação dos autores do tiroteio. Lucídio Cabral de Oliveira (11 anos) disse ter testemunhado a execução de Odilon: “um policial com o rosto pintado de preto deu um tiro no pescoço de Odilon”.

Ari Pinheiro dos Santos (33 anos) recebeu 11 tiros, 6 destes à queima-roupa, destruindo seu rosto e crânio. Das 5 balas retiradas do corpo de Ari, uma delas foi identificada como disparada por um soldado da PM, Luiz Carlos de Almeida.

Sérgio Rodrigues Gomes (24 anos) foi preso com outros trabalhadores e levado ao campo de futebol onde a PM tinha montado sua base, próximo à Fazenda Santa Elina. Seu corpo foi encontrado em 24 de agosto boiando no rio Tanuro com 3 fraturas no crânio e face.
Várias testemunhas que viram Sérgio vivo no acampamento da PM confirmaram ter visto um policial espancando violentamente alguns desses trabalhadores, incluindo Sérgio. Como testemunhas: Marcelo Girelli, Arnaldo Carlos Teco da Silva (prefeito de Corumbiara), Osias Labajo Garete (jornalista), José Carlos Moreira;

uma vítima identificada como “H-5” recebeu um único tiro no olho direito à queima-roupa e jogado em um riacho;

Darci Nunes do Nascimento recebeu um tiro por trás da orelha enquanto estava deitado com o rosto no chão;

Várias testemunhas sobreviventes e outros passantes confirmaram que, uma vez no controle da situação, a polícia e outros homens armados submeteram os trabalhadores, que estavam presos, amarrados e deitados no chão, a espancamentos, humilhações e tratamento desumano e degradantes, e que esses trabalhadores ainda forma novamente espancados na delegacia de polícia do Colorado do Oeste, obrigando-os a fazer declarações contrárias aos fatos.

No relatório quanto ao mérito poderão encontrar todos os relatos de testemunhas, perícias de cada caso e muito mais.
Documento: http://sdrv.ms/ZYqcfu.


RESULTADO PROCESSUAL

Os julgamentos ocorreram nos dias 14, 21, 23, 25, 29 e 31 de agosto de 2000, e 4 e 6 de setembro do mesmo ano. Dos 12 policiais denunciados, dez foram julgados pelas mortes de José Marcondes da Silva, Ercílio Oliveira Campos e o desconhecido H-5, resultando na condenação de 3 (três) deles. Dois policiais foram absolvidos – um pela tentativa de assassinato de Moacir Camargo Ferreira e o oficial que permitiu a retirada de Sergio Rodrigues Gomes do campo de futebol.

Os policiais condenados foram:
Vitório Regis Mena Mendes, capital da PM: 19 anos e 6 meses de prisão, em regime fechado;
Daniel da Silva Furtado, soldado da PM: 16 anos;
Airton Ramos de Morais, soldado da PM: 18 anos.
Todos tiveram direito a um novo julgamento.

A pedido do promotor Tarcísio Leite Matos, dois oficiais e um soldado foram absolvidos. Entre suas declarações, disse que “ou o Brasil acaba com os sem-terra ou os sem-terra acabam com o Brasil”, foi afastado pelo Ministério Público (quando penso que já ouvi de tudo...).

Nenhum policial militar, nem qualquer outra autoridade, nem os fazendeiros envolvidos, nem seus pistoleiros, foram processados ou condenados pela morte da menina Vanessa, nem pela dos demais trabalhadores, ocorridas em decorrência dos fatos.

Também não foi devidamente investigada a alegada cremação de corpos, nem o denunciado desaparecimento do trabalhador Darli Martins Pereira. O bispo de Guajará Mirim, Dom Geraldo Verdier, recolheu amostras de ossos calcinados em fogueiras do acampamento e enviou à Faculté de Médicine Paris-Oeste, que confirmou a cremação de corpos humanos no acampamento da fazenda.

Os trabalhadores condenados em 26 de agosto de 2000, pelo 1º Tribunal do Júri de Porto Velho/RO, por homicídio simples do tenente Rubens Fidélis e do soldado Ronaldo de Souza e por manter em cárcere privado os invasores da Fazenda Santa Elina, bem como a 2 meses de detenção em regime semiaberto por resistir ao mandado judicial de desocupação da fazenda, foram:

Claudemir Gilberto Ramos, 27 anos na época, condenado à 8 anos e 6 meses de prisão;
Cícero Pereira Leite Neto, 42 anos na época, condenado à 6 anos e 2 meses.
Por serem primários e não terem antecedentes criminais puderam permanecer em liberdade até o julgamento do recurso apresentado por sua defesa.
Pasmem: o Ministério Público alegou que, embora não houvesse provas técnicas, mas por serem líderes da invasão, Cícero e Claudemir tiveram participação nas mortes: os sem-terra tinham espingardas.

No entanto, ao contrário do que os laudos necroscópicos feitos nos corpos dos sem-terra comprovaram (execuções sumárias, à queima-roupa, espancamentos, etc.), resultando em inúmeras absolvições de policiais, o processo contra os trabalhadores sem-terra não apontava qualquer indício técnico de que eles tivessem atirado contra os PPMM, nem sequer que as armas que dispararam os projéteis encontrados nos corpos das vítimas foram identificadas. O recurso foi fundamentado por ter sido o resultado “manifestamente contrário à prova dos autos”.


PERDA DE PATENTE

Através do Decreto n. 16.721, de 4 de maio de 2012, o governador Confúcio Moura cassou o posto e a patente de oficial da PM de Rondônia do major Vitório Régis Mena Mendes, que foi subcomandante do grupamento de policiais militares na chacina de Corumbiara, em 1995.

O Ministério Público foi autor do pedido da perda da patente bem como da declaração de inconstitucionalidade da EC n. 23/2001 e a suspensão imediata de todo e qualquer pagamento dos proventos da reserva remunerada para a qual ele foi, segundo o MP, “indevidamente transferido”. No entanto, os desembargadores da 1ª Câmara decidiram, por maioria, que apesar da gravidade do caso, o oficial teve uma vasta folha de serviços oferecidos ao Estado e, desde sua condenação, nunca esteve envolvido em outra transgressão, no lapso temporal de 10 anos.


ANISTIA

No dia 24 de abril de 2013, a Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania aprovou a proposta constante no Projeto de Lei n. 2000/2011, de autoria do Deputado João Paulo Cunha (PT-SP), que concede anistia aos trabalhadores rurais e policiais militares punidos no episódio de Corumbiara.
Inicialmente, a proposta era apenas para os trabalhadores rurais, mas o relator da proposta, Deputado Vieira da Cunha (PDT-RS) incluiu os policiais militares, após a manifestação de outros parlamentares, sob o argumento de que a “anistia deve ser ampla e irrestrita”. No dia 02 de maio, o site da Câmara noticiou estar analisando a proposta.


Reflexões:
se a ação é legítima e legal, não me parece razoável policiais darem apoio à desocupação de terras encapuzados e às 3 horas da manhã.

armas de defesa dos sem-terra: 2 revólveres – um calibre 38 e outro 22, espingardas velhas usadas para caça e ferramentas de trabalho, inclusive motosserras, emprestadas por quem queria ajudar;

armas da PM – somente dos policiais do 3º BPM foram: 175 revólveres calibre 38, 12 escopetas calibre 12, 5 metralhadoras de 9mm, 4 pistolas, 5 mosquetes calibre 7,32, e 5 carabinas. Isso sem contar com as armas do COE, os PPMM que estavam de férias e as armas e munições dos jagunços e da chamada “PM2”. Somente parte das armas da PM foram submetidas à perícia, e só 3 provas de balística foram positivas (que incrível!).

Fonte: notícias em sites da internet e relatório da OEA.