Na
época, o Exército ocupava o local com a finalidade de realizar a
segurança do pessoal, material e equipamentos empregados nas obras
do Projeto Cimento Social, no Morro da Providência, idealizado pelo
Senador Marcelo Crivela.
Dia
14 de junho de 2008, sábado. Marcos Paulo da Silva (17 anos),
Wellington Gonzaga Costa (19 anos) e David Wilson Florença da Silva
(24 anos), moradores do Morro da Providência, na zona portuária do
Rio, foram abordados por militares do Exército às 7h30min quando
retornavam de táxi de um baile funk.
Segundo
depoimentos dos militares envolvidos, eles abordaram os jovens porque
perceberam que um deles estava com algo debaixo da camisa e preso na
cintura... acharam que fosse uma arma. Houve confusão durante a
revista e, portanto, conduziram os jovens para a Delegacia Judiciária
Militar, na região do Santo Cristo, para autuá-los por desacato,
porém, o capitão responsável pelo local, Leandro Ferrari, ordenou
que eles fossem liberados após serem ouvidos.
Testemunhas
afirmam que os jovens ficaram em poder dos militares até as 11h30min
e, depois, em vez de cumprir a ordem de seu superior, os entregaram a
traficantes de uma facção rival à do Morro da Providência, no
Morro da Mineira. Foram torturados por mais de seis horas e, segundo
testemunhas, executados por volta das 18h do sábado. Seus corpos
foram jogados no aterro sanitário de Gramacho, Duque de Caxias.
De
acordo com o laudo do IML, Wellington teve as mãos amarradas e o
corpo perfurado com vários tiros; David teve um dos braços quase
decepado e também foi baleado; e Marcos morreu com um tiro no peito
e foi arrastado pela favela com as pernas amarradas. Os corpos foram
encontrados no lixão de Gramacho, em Duque de Caxias, na Baixada
Fluminense.
A
REVOLTA DA POPULAÇÃO
(notícia
veiculada pela A Nova Democracia.com)
Antes
mesmo de ser confirmada a morte dos três jovens, mais de 200
moradores do morro da Providência foram até o Largo de Santo
Cristo, onde realizaram um protesto que parou a cidade. Um ônibus
foi queimado e outros nove apedrejados. O exército reagiu com
bombas, mas a massa respondeu com pedras e garrafas.
Quando retornaram pela noite, moradores foram ao alto do morro e retiraram a bandeira do Brasil do mastro — que simbolizava o domínio do Exército — e hostilizaram as tropas que permaneciam na Providência. No Farias — área onde os rapazes foram sequestrados — soldados tiveram que fugir correndo, quando mais de 100 pessoas, aos gritos de "Assassinos! Assassinos!" partiram para cima da tropa.
No dia seguinte, mais protestos. Cerca de 300 moradores e parentes dos jovens foram até a porta do quartel no Largo de Santo Cristo para pedir justiça. Novo confronto.
Na segunda-feira, dia do enterro dos rapazes, mais de mil pessoas foram ao cemitério prestar solidariedade às famílias e o que se viu foi a indignação de toda a comunidade contra o Exército e o candidato a prefeito e bispo da Igreja Universal do Reino de Deus Marcelo Crivella, autor do projeto eleitoreiro que levou tropas do Exército para a Providência. No velório, não faltaram denúncias sobre a presença dos soldados na comunidade.
— Outro dia eu estava em casa vendo televisão e escutei um barulho no portão. Quando olhei pela varanda tinha um militar. Vi pela patente que era um sargento. Eu sei por que eu já servi quartel. Ele estava jogando o pó [cocaína] em cima da carteira para cheirar. Quando eu bati no portão pra que ele saísse, ainda escutei um desaforo — conta um morador indignado.
Logo após o velório, os moradores seguiram em quase dez ônibus para a porta do Comando Militar do Leste para um novo protesto. Mais uma vez a tropa de choque do Exército respondeu com bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo e a massa respondeu, atacando o prédio do Comando Militar do Leste com paus e pedras.
Entre
as frases preferidas de Vinícius Ghidetti, este diz detestar o “uso
de drogas e as piranhas que se fazem de santinhas”, e parece ter
levado a sério o demasiado rigor com que a AMAN forma seus
militares, como demonstra uma das frases impressas nas camisas
vendidas na instituição: “Só stress. Não há limites para a
maldade”.
À direita,
Tenente Vinícius Guidetti
DADOS
PROCESSUAIS
Na
decisão de pronúncia dos acusados: relato do fato, descrição dos
laudos cadavéricos dos 3 jovens, trecho do depoimento de Vinícius
Ghidetti – link: http://sdrv.ms/183GIxb.
Foram
denunciados, em 27 de junho de 2008, como incursos nas penas do
artigo 121, §2º, incisos I, III e IV, por 3 vezes, na forma dos
artigos 29 e 69, todos do Código Penal:
→
Leandro Maia Bueno
→
Vinícius Ghidetti de Moraes Andrade
→
José Ricardo Rodrigues de Araújo
→
Bruno Eduardo de Fátima
→
Renato de Oliveira Alves
→
Julio Almeida Ré
→
Rafael Cunha da Costa Sá
→
Sidney de Oliveira Barros
→
Fabiano Eloi dos Santos
→
Samuel de Souza Oliveira
→
Eduardo Pereira de Oliveira
Segundo
os procuradores, fundamentados no diálogo entre o tenente Ghidetti e
os jovens, a caminho do morro da Mineira, em uma parada no
Sambódromo, reproduzido nos depoimentos dos militares, o tenente foi
à caçamba do caminhão e perguntou aos jovens se estavam
arrependidos, tendo como resposta de um deles “Não. Tô gostando”.
Então,
o oficial anunciou que eles seriam entregues aos traficantes e
admitiu que poderiam morrer. Como nenhum dos demais militares fez
nada para evitar a consumação do fato, eles responderão por
omissão. Na denúncia, o sargento Maia será apontado como
responsável pela negociação com os traficantes, o soldado
Rodrigues como quem levou o grupo até o Morro da Mineira e seu
colega, Fabiano, será responsabilizado por ter evitado que um do
jovens fugisse – disseram os Procuradores na época.
O
tenente Ghidetti teria dito ainda, segundo testemunhas, que os jovens
seriam um “presentinho” para os traficantes da Mineira, mas, no
depoimento e em juízo, negou e afirmou apenas que desejava dar um
“susto” nos rapazes. No entanto, o juiz declarou que o tenente
viu os rapazes apanhando de seis traficantes e nada fez para impedir.
O
oficial chegou a chorar quando disse que era casado há seis meses e
tinha um filho de 2 meses, na época do fato. Tentou convencer o juiz
de que desejava apenas dar um “corretivo” nos rapazes e de que
não pretendia entrega-los à traficantes: "Houve
um encontro fortuito, tanto que ficamos assustados. Por isso, o
sargento Maia foi até eles explicar que não era uma operação. E
que só queríamos dar um susto nos três, que tinham nos
desacatado”.
O
sargento foi o segundo a depor e se contradisse várias vezes, sendo
advertido pelo juiz: "Não caí de para-quedas nessa cadeira.
Não fui criado em apartamento do Leblon. Não soltei pipa em
ventilador nem joguei bola de gude em carpete. Sou da zona norte.
Portanto, quero coerência", disse o juiz Granado. Maia negou
que tivesse avisado os traficantes de que estavam ali para dar um
corretivo nos jovens. Confrontado pelo juiz com o depoimento do
tenente, voltou atrás, mas insistiu que o fato de ter dito aos
traficantes que estavam ali para dar um corretivo foi "mera
coincidência" com o que pensava o tenente. Ele não teria
recebido instrução do superior.
Tiveram
suas prisões preventivas REVOGADAS e, posteriormente, foram
IMPRONUNCIADOS:
→
Em 07/07/2008: Eduardo Pereira de Oliveira, Bruno Eduardo de Fátima
e Samuel de Souza Oliveira;
→
Em 12/11/2008: Renato de Oliveira Alves e José Ricardo Rodrigues de
Araújo – link com trechos de seus depoimentos que culminaram na
revogação: http://sdrv.ms/14EurxQ.
→
Em 21/11/2008: Sidney de Oliveira Barros, Julio Almeida Ré e Rafael
Cunha da Costa Sá – link com trechos de seus depoimentos que
culminaram na revogação: http://sdrv.ms/14EuZ6P.
→
Em 03/05/2010: na sentença de pronúncia de Vinícius e Leandro foi
revogada a prisão de Fabiano Eloi dos Santos (link mencionado no
início dos “dados processuais”).
Pronunciados
foram, apenas, o tenente Vinícius Ghidetti e o sargento Leandro Maia
Bueno. Ambos tiveram liberdade provisória concedida em 24/08/2011,
com suspensão da função pública. O Ministério Público Federal
recorreu e, em 30/01/2012, apresentaram-se no Batalhão de Infantaria
Motorizada para recolherem-se presos.
A
partir daí, Vinícius começou (!) a apresentar perturbação da
saúde mental e, na oportunidade do julgamento pelo Tribunal do Júri,
em 06/08/2012, o juízo determinou a separação dos julgamentos de
Vinícius e Leandro – este último foi ABSOLVIDO (!!!). O outro,
submetido a tratamento psiquiátrico.
Link:
http://sdrv.ms/16kFzxU.
Cabe
recurso.
Vinícius
foi internado no Hospital Central do Exército em tratamento
psiquiátrico e, submetido a novo laudo, foi diagnosticado com
Transtorno Dissociativo, não especificado (F44.9), que se perfaz em
perda parcial ou completa entre memórias do passado, consciência de
identidade e sensações imediatas e controle dos movimentos
corporais, havendo possibilidade de o réu ser submetido a tratamento
ambulatorial com acompanhamento de seu curador, e que a tornozeleira
eletrônica é compatível com sua atual situação psíquica.
Em
19/12/2012, Vinícius teve sua prisão preventiva convertida em
medida cautelar pessoal de:
→
tratamento ambulatorial realizado no HCE;
→
proibição de aproximar-se a menos de 200m do Morro da Providência;
→
proibição de manter qualquer tipo de contato com familiares das
vítimas e testemunhas arroladas pela acusação no processo, entre
outras medidas – link para a decisão: http://sdrv.ms/14ExAgW.
Esse,
até o momento, é o saldo: uma absolvição e o outro –
desmembrado seu processo – com o processo suspenso por
superveniência de doença mental.
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