Desde que
comecei com esta série, este, embora seja o mais curto relato que
vou escrever, foi o que me causou maior indignação até o momento.
Não que o episódio tenha sido “mais terrível” do que os
outros... não foi. Mas pelo desfecho que teve.
Por
muitas vezes, minhas aspirações e posicionamentos acerca da
aplicação do Direito, da realização de “justiça”, levam
muitos a crer que defendo criminosos ou qualquer absurdo parecido com
este. Isso está longe de condizer com a verdade. O que defendo é a
igualdade de aplicação do Direito, o ordenamento jurídico
brasileiro como um todo, PARA TODOS, e não apenas para uma gama
privilegiada.
Tenho
quase certeza – digo “quase” porque é perigoso o uso de
palavras inflexíveis como “absoluta”, enfim – que se certos
criminosos fizessem parte desta mesma gama privilegiada, os episódios
teriam um curso diferente, seja quanto ao próprio acontecimento em
si, seja quanto ao andamento processual.
Justamente
minha indignação comprova que, embora “defensora dos direitos
humanos”, classe amplamente apedrejada nos dias de hoje, repudio
completamente, tenho ojeriza e nojo em relação ao desfecho deste
caso.
Imagino
que alguns poderão pensar “mas é claro que ela não gostou do
desfecho... ninguém foi punido por matar os 'coitadinhos'!” –
pois, as vítimas deste caso eram marginais. Mas, digo-lhes uma
coisa: e se você não soubesse exatamente o que um ente querido seu
estivesse fazendo pelas ruas, e caísse este nas amarras da lei pelo
descumprimento de nossas normas penais, você desejaria a retirada de
todos os seus direitos ou, melhor (ou pior): seu apedrejamento e
morte?
Na melhor
das hipóteses, o que já vimos algumas vezes na mídia, são pais
que entregam seus filhos que cometeram crimes para serem processados
e julgados. APLAUSOS! ESTE é o verdadeiro ensinamento ao criminoso e
demonstração de repúdio ao ato por este cometido. Este ingressa no
crime e não faz vítimas somente pessoas alheias ao seu convívio
mas, além de receber o estigma social, (infelizmente) também o
recebe seus familiares que, por isso, sofrem duas, senão, várias
vezes.
Sem mais
delongas, vamos ao caso...
CONTEXTO FÁTICO
Na madrugada do dia 20 de dezembro de 1986 – um sábado – três
indivíduos, Luiz Iremar Gonfio (19), Edivaldo Xavier de Almeida (20)
e Aurico Reis (18), sequestraram o casal Shirley do Nascimento (22) e
seu noivo, o fotógrafo Júlio César Jarros (26), na porta da casa
de Shirley. Fora da cidade, estupraram Shirley e mataram a tiros seu
noivo, Júlio.
Quinze horas depois, na manhã do domingo, 21 de dezembro, as
emissoras de Umuarama noticiavam a prisão dos rapazes, notícia
recebida com entusiasmo pela população, o que logo foi substituído
por um desejo de vingança frente a uma atitude de Edivaldo, durante
a reconstituição do fato.
Neste mesmo domingo, no decorrer do dia, os rapazes confessaram o
crime durante o interrogatório e foram conduzidos pelas autoridades
ao local do crime para reconstituição. Quando a polícia indagou
Edivaldo sobre a forma como matara o fotógrafo, ele disse
ironicamente: “Por que não me dão um revólver carregado?”.
Na noite de segunda-feira, 21 de dezembro de 1986, segundo relatos,
cerca de 2 mil pessoas cercaram a cadeia de Umuarama, venceram a
resistência policial e arrebataram os três, sendo assassinados a
pauladas, seus corpos arrastados por quilômetros pela Avenida Paraná
e levados para a praça Miguel Rossafa, onde foram molhados com
gasolina e queimados.
Segundo o Secretário de Segurança Pública do Paraná na época,
Jesus Sarrao, que condenou o linchamento, os policiais encontravam-se
diante de um impasse: ou metralhavam a população, ou limitavam-se a
persuadir a multidão a não fazer aquilo – o que tentaram fazer
sem sucesso.
O FATO
(relato encontrado na revista Veja, edição 956, de 31 de dezembro
de 1986)
Na noite de 22 de dezembro de 1986, um grupo de pessoas não
identificadas marchou para a delegacia pedindo a adesão de todos que
encontrava pelo caminho. Ao chegar diante da cadeia, a multidão
crescera a tal ponto que os 30 homens da PM e a meia dúzia de
agentes da Polícia Civil, ali postados para guardar os presos, deram
brandos sinais de resistência. Entregues à própria fúria, os
participantes do linchamento amarraram os corpos dos mortos em
automóveis e os arrastaram num cortejo que atraiu para as janelas e
calçadas mais de 5 mil pessoas. O desfile foi aplaudido. A cada
esquina aumentava o coro: “Queima, queima” (…). Foi o que se
fez em seguida, com a ajuda de 1 litro de gasolina e uma caixa de
fósforos, além de alguns pneus para manter as chamas vivas por um
tempo.
Declaração do delegado Luiz Norberto Canhoto, responsável pelas
investigações na época: “Talvez demore a identificação, mas os
envolvidos vão responder por homicídio e arrebatamento de presos”.
No vídeo,
é possível ver o momento em que os corpos são arrastados pela
cidade e queimados em praça pública sob os aplausos da população.
INFORMAÇÕES
SOBRE O POST FACTUM
(únicas
notícias encontradas sobre o caso)
Os
incitadores, após seu reconhecimento, foram processados por
“arrebatamento de preso” e “vilipêndio a cadáver”, em 1987,
e, conjectura-se que por não ser possível apurar quem realmente
matou os presos arrebatados – pois, centenas foram os invasores do
“cadeião” – ninguém respondeu por homicídio.
O
processo correu na comarca de Umuarama e, sem chegar a lugar algum,
cansou. Passados 20 anos do crime consumado, sem transitar em julgado
a sentença final – se é que houve alguma, extinguiu-se a
punibilidade para os réus e o processo foi arquivado.
Esse foi
o desfecho deste caso... sem mais!
Fonte: Veja - Lobservando - Portal PGF
Era criança quando isso aconteceu mas me lembro bem, infelizmente aconteceu na cidade onde eu morava, que Deus nos abençoe!
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