quarta-feira, 9 de outubro de 2013

CASO VIA SHOW, Baixada Fluminense/RJ (2003) - 26ª edição

Vítimas do fato

Noite de cinco de dezembro de 2003. Os amigos Geraldo Sant'Anna de Azevedo Júnior (21), Bruno Muniz Paulino (20), Rafael Paulino (18) e Renan Medina Paulino (13) resolvem se divertir juntos em um show na casa noturna “Via Show”, localizada na Baixada Fluminense.

Na saída, madrugada do dia 6 de dezembro, os rapazes foram vistos pela última vez, por outro amigo com o qual se encontraram na casa de show, Wallace Lima, às 4h40, no estacionamento. Depois, seus corpos foram encontrados em um poço após denúncia anônima, no dia 9 de dezembro, com marcas de tortura e suas cabeças destruídas por tiros de fuzil.


INVESTIGAÇÕES

Segundo as investigações, Geraldo foi agredido por policiais militares que faziam segurança na casa de show, ainda no estacionamento, porque o soldado PM Henrique, que era chefe de segurança dos camarotes da casa noturna, imaginou que Geraldo estivesse tentando furtar seu carro, um Kadett vermelho. Como os amigos de Geraldo intercederam em favor deste, os policiais resolveram dar uma lição exemplar nos rapazes. Portanto, foram mortos para garantir a impunidade das violências empregadas contra Geraldo. Henrique e Fábio contataram o capitão Ronald – no momento, em serviço como oficial supervisor do 15º BPM – que, na companhia de seu motorista, Vagner, participaram das agressões e posterior morte dos rapazes. Estes foram conduzidos, posteriormente, em três veículos, sob ameaças com armas de fogo, para uma fazenda abandonada conhecida como “Parada Morambi”, em Duque de Caxias, onde foram executados.

Também foram convocados por Ronald para “dar uma ajuda” os policiais que estavam de serviço em um DPO de Parada Angélica, Gilberto e Luiz Carlos, acompanhando a caravana que conduzia as vítimas para o local de execução, nada fazendo para evitar a consumação do homicídio – suas condutas foram consideradas como “omissão penalmente relevante” – encontrei um excelente exemplo de crime omissivo impróprio; policial é agente garantidor!!! Encontrarão todos os detalhes do caso na sentença de Henrique.


DADOS PROCESSUAIS

Em julho de 2004, o Ministério Público ofereceu denúncia que foi recebida pelo juízo da 4ª Vara Criminal de Duque de Caxias, em 17 de agosto do mesmo ano, em face de:
Ronald Paulo Alves Pereira, capitão PM, em serviço no momento do fato como oficial supervisor do 15º BPM;
Gilberto Ferreira de Paiva, soldado PM, em serviço no DPO de Parada Angélica – teve extinta sua punibilidade por morte;
Luiz Carlos de Almeida, soldado PM, em serviço no DPO de Parada Angélica;
Vagner Luís Victorino, soldado PM, em serviço, dirigiu a viatura do oficial supervisor;
Henrique Vitor de Oliveira Vieira, soldado PM, chefe de segurança dos camarotes da casa;
Fábio de Guimarães Vasconcelos, soldado PM, chefe de revista;
Paulo César Manoel da Conceição, soldado PM
Eduardo Neves dos Santos, soldado PM

Em 14 de outubro de 2004 a denúncia foi aditada tanto objetiva quanto subjetivamente, ocasião em que foi inserido como réu o policial militar Daniel Rosa.

Em sede de habeas corpus, os réus foram beneficiados com a liberdade, pois, entendeu o TJRJ que o decreto não estava adequadamente fundamentado.

No dia 17 de junho de 2005, o juízo desmembrou o feito para os réus Luíz, Vagner, Ronald, Daniel Rosa e Gilberto (processo n. 2003.021.021883-1), permanecendo no processo n. 2003.021.021302-0 os réus Henrique, Paulo, Eduardo e Fábio.

Nesta mesma data foram PRONUNCIADOS os réus Henrique, Fábio, Paulo e Eduardo como incursos no artigo 121, §2º, incisos IV e V (duas vezes), quanto às vítimas Rafael e Bruno; artigo 211 (quatro vezes) e artigo 288, parágrafo único, todos na forma do artigo 69, todos do Código Penal; na ocasião, decretada a prisão preventiva dos mesmos.

Impetraram novamente HC em face da decisão de pronúncia, os réus Henrique, Paulo César, Eduardo, Ronald e Vagner, todos denegados para manter a custódia preventiva; no entanto, Recursos em Sentido Estritos opostos em face desta decisão denegatória conseguiram a liberdade de todos os réus para aguardar o julgamento no Tribunal do Júri em liberdade. Isto porque o Tribunal de Justiça considerou que os réus estavam sendo constrangidos, pois, desde a sentença de pronúncia, passaram-se mais de onze meses e não fora realizado ainda o julgamento no Tribunal do Júri (link para a decisão: http://sdrv.ms/1dJGsqD).

Em 4 de outubro de 2005, o juízo Estadual declinou a competência para a Justiça Militar quanto ao homicídio da vítima Geraldo, militar do Exército (link para o declínio: http://sdrv.ms/14WvmHG). Segundo o magistrado, militar em situação de atividade não deve ser confundido com militar em serviço, mas sim militar da ativa; trouxe precedentes do STF e STJ. Apesar disso, foi prorrogada a competência do Juízo de Duque de Caxias (link: http://sdrv.ms/1dionBc).

No dia 06 de outubro de 2005, foi proferida sentença de PRONÚNCIA:
em desfavor de Ronald e Vagner como incursos no art. 121, §2º, incisos IV e V e §4º, segunda parte c/c art. 29, ambos do CP (quanto a vítima Renan); art. 121, §2º, incisos IV e V c/c art. 29 ambos do CP (duas vezes, quanto às vítimas Rafael e Bruno), bem como no artigo 211 (três vezes). 
→ na mesma ocasião, foram PRONUNCIADOS Gilberto e Luiz Carlos como incursos nos artigos 121 § 2º, IV e V, c/c art. 13 § 2º - alínea a, c/c art. 29 caput, (duas vezes, quanto as vítimas Rafael e Bruno) e Art. 121 § 2º IV e V. e § 4º, segunda parte, c/c art. 13 § 2º - alínea a , c/c art. 29 caput ( com relação a vítima Renan) e ainda art. 211 (três vezes), tudo na foram do art. 69 CP, todos do Código Penal.
foi PRONUNCIADO o acusado Daniel Rosa como incurso na penas do art. 288, parágrafo único do CP, e IMPRONUNCIADO das imputações relativas aos homicídios das vítimas Rafael, Bruno e Renan, bem como das imputações relativas às ocultações de seus cadáveres.
foram IMPRONUNCIADOS os acusados Ronald Paulo Alves Pereira e Vagner Luiz Vitorino da imputação de quadrilha armada.

Ainda em 2006 foi pedido exame de sanidade mental do réu Vagner e, em 30 de março, declarada extinta a punibilidade de Gilberto devido seu falecimento.

No dia 21 de junho de 2006, o soldado Henrique foi julgado e condenado às penas de 25 anos e 7 meses de prisão (link para sentença: http://sdrv.ms/18WwP43). Desta condenação, houve Protesto Por Novo Júri, designando-se nova audiência para 23/10/2006, 17/11/2006, 27/07/2007, 09/08/2007, todos adiados e, nesta última data, foi nomeado Defensor Público para Henrique que, finalmente, foi julgado no dia 20 de agosto de 2008, juntamente com os réus Fábio, Paulo César e Eduardo – Henrique foi CONDENADO à 67 anos de reclusão e os demais à 68 anos e 4 meses de reclusão – o primeiro já se encontrava preso e foi determinada a expedição de mandado de prisão para os demais (link para a sentença: http://sdrv.ms/1aJwExd).

No entanto, Paulo César e Eduardo foram beneficiados com decisão da Sexta Câmara Criminal, podendo aguardar o julgamento do recurso em liberdade (links: http://sdrv.ms/17ZukNt e http://sdrv.ms/17Zumov). Segundo o relator da decisão, os presos estavam sofrendo constrangimento na prisão, já tendo decidido pela libertação dos mesmos – bem como de outros policiais militares envolvidos no caso – antes da interposição do recurso.

No entanto, em 05 de dezembro de 2011, a preliminar de cerceamento de defesa arguida no recurso foi reconhecida, porém, rejeitada por não ter sido suscitada em momento oportuno, deixando claro o desembargador que “o regime fechado para todos é o único possível”... ainda interpuseram embargos de declaração em face da decisão, também este denegado em 25 de julho de 2012. Foram recolhidos ao Batalhão Especial Prisional – BEP.

Audiência de Ronald, no Tribunal do Júri, designada para 20 de agosto de 2009, remarcada e realizada em 27 de agosto de 2009 declarando suspensão por superveniência de doença mental ao réu Vagner e nulidade desde a pronúncia quanto ao réu Luiz Carlos (link: http://sdrv.ms/1aJIffA).

Pasme, sete anos depois – em 9 de março de 2012 – foi proferida nova decisão de pronúncia apenas para o réu Ronald, concedendo ao mesmo do direito de permanecer em liberdade até o julgamento pelo Tribunal do Júri. Argumento: “pois que não encontro qualquer justificativa a permitir solução diversa, até em respeito ao princípio constitucional da presunção de inocência, o que também não permite o acolhimento do desarrazoado pedido de suspensão cautelar do exercício de função pública, em razão do tempo decorrido, o que importaria tão somente, a meu sentir, em interferência indevida do Poder Judiciário na administração disciplinar da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro” (link: http://sdrv.ms/1dJYwki). Obviamente – e ele não perderia a chance – interpôs RESE, que aguarda julgamento... até hoje!


RESUMO DA ÓPERA:
Henrique, Paulo, Eduardo e Fábio, segundo informações processuais, encontram-se presos no BEP e perderam o cargo;
Ronald, segundo informações do Extra Online, em 2011 trabalhava na DGP, participou de Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais em 2010, viajou com autorização do comando para Recife a fim de participar de cursos com preparativos para a Copa do Mundo em 2014 e, um mês após a chacina da Via Show – em janeiro de 2004 – recebeu uma moção de louvor do Deputado Flávio Bolsonaro pelos “ótimos serviços prestados”. Portanto, ainda integra a PMERJ, embora pronunciado, não foi julgado até hoje;
Vagner tem seu processo suspenso por superveniência de doença mental;
Luiz Carlos teve seu processo anulado desde a pronúncia e desmembrado; ainda aguarda julgamento;
Gilberto teve extinta sua punibilidade por morte;
Daniel foi pronunciado por formação de quadrilha (isso mesmo – art. 78, I do CPP); também ainda não consta julgamento.


CURIOSIDADES

Os seguranças da casa de show continuam a ser acusados de envolvimento em crimes violentos: no dia 3 de novembro de 2007, José Diego de Oliveira Alencar (21) e os irmãos Fábio da Silva (26) e Alexandre da Silva (25), foram encontrados baleados na Rua Maria Januária, próximo à Via Dutra, em São João de Meriti, devido a uma briga motivada por ciúmes. Os rapazes foram expulsos da casa noturna pelos seguranças e foram abordados no ponto de ônibus por 4 homens armados que estavam de carro e moto. Diego tentou fugir e levou um tiro nas costas. Os irmãos levaram tiros no rosto e na nuca.

Em novembro de 2010, a 16ª Câmara Cível do TJRJ condenou a casa de espetáculos Via Show e o Governo do Estado do RJ a indenizarem em R$ 660 mil, por danos morais, a família do cabo do Exército Geraldo Sant'anna de Azevedo Júnior, indenização cujo pagamento será dividido entre os réus. A mãe e o pai de Geraldo receberão, cada um, R$ 300mil, a irmã, R$ 40mil e a tia R$ 20mil, além do pagamento de uma pensão mensal, no valor de um salário mínimo aos pais de Geraldo, cabendo a metade a cada um deles até a data em que Geraldo faria 65 anos de idade. Os réus pagarão, ainda, os gastos da família com funeral (3 salários mínimos) e R$ 11mil referente ao veículo de Geraldo, desaparecido no dia do fato e encontrado, posteriormente, depenado.

A Câmara, na ocasião, reformou em parte a sentença da 6ª Vara de Fazenda Pública da Capital, negando provimento aos recursos do Estado e da casa de shows. Segundo o relator, em caso de suspeita de furto, a obrigação dos policiais era encaminhar o rapaz à Delegacia, e não julgá-lo e executá-lo sumariamente.

Posteriormente, a família de Geraldo entrou com um recurso e, em julho de 2012, a 10ª Câmara Cível aumentou para R$ 80mil o valor da indenização a ser paga à irmã de Geraldo. A decisão manteve as condenações anteriores supramencionadas.

Reportagem de 2011

Fonte: Rede Contra a Violência.org
           Justiça Global Brasil
           Passa palavra.info
           Extra Online
           Último segundo.ig


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